domingo, 18 de maio de 2008

O desafio é chegar aonde o povo está

17/5/2008

Por Vilmar Sidnei Demamam Berna*

Com a demissão da Ministra Marina Silva, a queda de braço entre progresso e meio ambiente está assumindo contornos cada vez mais claros no governo Lula. Por trás deste embate existe um mito, o de que a destruição ambiental é o preço amargo a pagar pelo progresso, emprego, comida, moradia, pontes e estradas, etc. Trata-se de um equívoco comprovado por Carlos E. F. Young, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Entre 1985 e 1996, nos estados do Sul e do Sudeste, a mata atlântica perdeu mais de 1 milhão de hectares enquanto, no mesmo período e região, houve a redução de 2,4 milhões de postos de trabalho na agropecuária. Em outras palavras, a sociedade aceitou e tolerou a destruição ambiental, na esperança de ver atendidas as suas necessidades, e continuou com as mesmas carências de antes, só que agora em pior situação, com desempregos e continuando a conviver com a miséria e agora também com poluição e degradação ambiental.

Quando Lula diz em relação à Amazônia que “se manter a floresta em pé é tão importante para o mundo, é importante que o mundo compreenda que isso tem custo, por que na região moram 25 milhões de habitantes que querem acesso aos benefícios que todos têm” (O Globo – 15/05), na verdade está afirmando que com a floresta em pé não há como atender as necessidades das pessoas que moram lá e isso não é verdade por que a floresta em pé é capaz de atender muito mais as necessidades da população que uma terra arrasada. O governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, foi mais claro em entrevista à Folha, em 24/04: “não há como produzir mais comida sem fazer a ocupação de novas áreas e a derrubada de árvores". São visões que refletem na verdade o que vai no sentimento da população. No fundo, a maioria pensa assim mesmo.

Existe uma consciência ambiental crescente, sem dúvida, mas esta consciência ainda está longe de sair do discurso e da boa vontade para a prática e este deve ser o desafio de todos nós que defendemos o meio ambiente. Precisamos encontrar formas e maneiras de chegar ao povo, de mostrar que a destruição ambiental muito longe de assegurar o progresso e o atendimento às necessidades humanas tem significado a perda dos serviços da natureza que mantém a fertilidade do solo, o regime de chuvas, os mananciais de abastecimento, etc.

E mais, toda essa destruição ambiental que está ocorrendo no Brasil, tem servido apenas para a contração da riqueza e do poder nas mãos de poucos. O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) comprovou que apenas 10% dos brasileiros mais ricos concentram 75,4% da riqueza do país.

O Brasil tem tido a sorte de ter ministros do meio ambiente competentes e comprometidos com a causa socioambiental, como o Sarney Filho, o José Carlos Carvalho, a Marina Silva, entretanto, o que pode fazer um ministério para preservar e cuidar do meio ambiente se praticamente todos os outros querem fazer o contrário? A ex-Ministra Marina Silva combateu o bom combate, ganhou algumas vezes a queda de braço interna dentro do Governo e perdeu muitas outras. E quando ela perdia, perdia o meio ambiente com o transgênico sendo aprovado mesmo contra o parecer técnico do IBAMA e da ANVISA, o desmatamento aumentando, a aprovação das hidrelétricas no rio Madeira, etc.

Nossas esperanças e nosso olhar se voltam agora para o novo ministro, Carlos Minc, com tradição na militância ambiental carioca, também Prêmio Global como o Chico Mendes, o Betinho, o Fábio Feldmann, entre outros. Numa democracia não vence quem tem mais armas, mas quem tem mais argumentos. E de todos os talentos do Minc, talvez o que mais se destaque é a sua capacidade de dialogar com os contrários sem abrir mão de princípios, seu jogo de cintura diante das situações mais difíceis e, especialmente, sua habilidade em falar com a imprensa, transformando temas áridos e de difícil entendimento em frases e conceitos claros para a população. Precisamos muito de alguém que consiga traduzir o ecologês para uma linguagem que chegue até ao povo e o Minc sabe fazer isso.

* Vilmar é escritor, jornalista e ambientalista. Por quase oito anos foi companheiro de ativismo do Minc nos Defensores da Terra e no mandato de deputado estadual e, assim como o Minc, também recebeu o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente, em 1999, por indicação do Fábio Feldmann. Contatos: vilmar@rebia.org.br

www.portaldomeioambiente.org.br

'De quem é a Amazônia, afinal?', diz 'NY Times'

18/05/2008 - 08h01

Uma reportagem publicada neste domingo no jornal americano The New York Times afirma que a sugestão feita por líderes globais de que a Amazônia não é patrimônio exclusivo de nenhum país está causando preocupação no Brasil.

No texto intitulado "De quem é esta floresta amazônica, afinal?", assinado pelo correspondente do jornal no Rio de Janeiro Alexei Barrionuevo, o jornal diz que "um coro de líderes internacionais está declarando mais abertamente a Amazônia como parte de um patrimônio muito maior do que apenas das nações que dividem o seu território".

O jornal cita o ex-vice-presidente americano Al Gore, que em 1989 disse que "ao contrário do que os brasileiros acreditam, a Amazônia não é propriedade deles, ela pertence a todos nós".

"Esses comentários não são bem-aceitos aqui (no Brasil)", diz o jornal. "Aliás, eles reacenderam velhas atitudes de protecionismo territorial e observação de invasores estrangeiros escondidos." Acesso restrito O jornal afirma que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenta aprovar uma lei para restringir o acesso à floresta amazônica, impondo um regime de licenças tanto para estrangeiros como para brasileiros.

"Mas muitos especialistas em Amazônia dizem que as restrições propostas entram em conflito com os próprios esforços (do presidente Lula) de dar ao Brasil uma voz maior nas negociações sobre mudanças climáticas globais - um reconhecimento implícito de que a Amazônia é crítica para o mundo como um todo", afirma a reportagem.

O jornal diz que "visto em um contexto global, as restrições refletem um debate maior sobre direitos de soberania contra o patrimônio da humanidade".

"Também existe uma briga sobre quem tem o direito de dar acesso a cientistas internacionais e ambientalistas que querem proteger essas áreas, e para companhias que querem explorá-las." "É uma briga que deve apenas se tornar mais complicada nos próximos anos, à luz de duas tendências conflituosas: uma demanda crescente por recursos energéticos e uma preocupação crescente com mudanças climáticas e poluição."