sábado, 23 de agosto de 2008

Mais um absurdo que comprova a insensibilidade ambiental e a estupidez humana

EM DEFESA DAS CAPIVARAS(Campinas)
Rodrigo Andreotti Musetti
Advogado em Direito Ambiental e
Mestre em Direito pela PUCC.

“Infelizmente não é a primeira vez que as capivaras são transformadas na bola da vez pela incompetência administrativa generalizada dos municípios em limpar terrenos urbanos e controlar a higiene pública. Desta vez são as capivaras da Cidade de Campinas – SP. Eis o título de um artigo da Revista “Já”, de 27/08/2000: “Caça às capivaras – Campinas declara guerra aos simpáticos roedores, que estariam disseminando doença na região.”
O fato, conforme a matéria, é que municípios da região possuem 392 casos suspeitos e 16 confirmados de febre maculosa – transmitida pelo carrapato-estrela. Em Campinas, devido ao desmatamento desenfreado, o hábitat destes animais está quase que totalmente extinto, a conseqüência lógica é a migração deles para as cidades. Numa iniciativa interessante, procurando adaptar ou amenizar o sofrimento destes animais que não encontram comida adequada e hábitat, a Prefeitura recolheu-os em parques públicos, como o Taquaral. Eles se adaptaram relativamente bem, mesmo porque se não se adaptassem morreriam. Ocorre que um funcionário deste Parque adoeceu e faleceu com os sintomas da febre maculosa: complicações renais e pulmonares, febre, dor de cabeça, dores no corpo, manchas avermelhadas na pele. Já foi o bastante. O Prefeito de Campinas foi à Brasília e pediu apoio do IBAMA e do Ministro Sarney Filho para resolver “o problema das capivaras”. Técnicos da Prefeitura, da Superintendência de Endemias do Governo do Estado e do IBAMA já estão em Campinas para estudar um plano de controle dos bichos em parques públicos.
Recentemente foram concluídos os exames no funcionário falecido – não morreu de febre maculosa!!! Surpresa, talvez não.
No ano 2000, só duas pessoas morreram desta febre, uma na cidade de Amparo e outra de Pedreira. Lembro-me de uma estudante da PUCCamp. que morreu em virtude desta febre e ela residia no centro da cidade de Campinas, em 1996, salvo engano.
Bom, o destino das capivaras que buscam sobreviver perante interesses que ditam Medidas Provisóriamente eternas parece já estar traçado. Claro, a população precisa de um culpado, de preferência algum já suspeito, seja por lenda ou verdade, por ignorância ou conhecimento.
Ora, quem transmite a doença é o carrapato e não as capivaras! Outrossim, os carrapatos-estrela (designação comum aos acarinos ixodídeos) não ficam só em capivaras, qualquer animal selvagem ou doméstico também é seu potencial portador. Os bovinos e os eqüinos também, aliás, os acarinos ixodídeos são também conhecidos por carrapato-de- cavalo, carrapato-redoleiro , carrapato-rodeleiro , carrapato-rodoleiro , coleira, picaço, redoleiro, rodolego e rodoleiro. Por que não exterminamos os bois de corte e as vacas leiteiras?! Por que não exterminamos os cavalos dos haras?! Por que não exterminamos cães e gatos domésticos?!
É evidente, qual o valor das capivaras silvestres nos parques públicos?! Se não mais desejam ter gastos com as capivaras, não é preciso vender a imagem de terríveis e perniciosos transmissores da febre maculosa. Sem falar dos métodos impróprios – vamos assassinar todos que possuem AIDS?!! Vamos matar aqueles que possuem doença contagiosa?! ! O pior é que a população que freqüenta os parques públicos comenta da beleza, simpatia e docilidade desses animais – exatamente o ponto que se pretende inverter.
É evidente que os dois casos de morte nada tiveram com as capivaras dos parques públicos, as vítimas moravam em áreas rurais – onde bovinos, eqüinos e outros animais são mais freqüentes.
Se querem caçar as capivaras, não arrumem pretexto irreal. Muitas vezes, o conhecimento gera uma educação sólida que não se contenta com a aparência dos fatos. A educação ambiental está gerando um novo tipo de cidadão, qual seja, aquele capaz de refletir sobre os problemas de seu ambiente e de enxergar além da superfície. Esta nova geração sabe que conhecer é poder, inclusive, poder defender a diversidade biológica de predadores astutos.
Com o passar do tempo, comprovaremos que o tiro que está prestes a ser disparado vai errar o alvo e os casos de febre maculosa continuarão aparecendo – quem erra a causa, agüenta o efeito!”