segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Diadema planeja comercializar área verde

Elaine Granconato
Do Diário do Grande ABC
Com escassez de vegetação na cidade, a Prefeitura de Diadema quer vender uma das poucas áreas verdes existentes. Projeto de lei do Executivo pede autorização para alienação de terreno municipal de cerca de 12 mil m², entre a Avenida Alda com a Rua Coimbra, no Parque Sete de Setembro, próximo à região central. Adiada por duas sessões na Câmara a pedido da oposição, a matéria que entra em pauta para votação na próxima quinta-feira, porém, já causa polêmica até mesmo entre os vereadores da situação.
"Quero esclarecimento por parte do Executivo da razão da venda, afinal temos muito poucas áreas verdes na cidade", afirmou Manoel Eduardo Marinho, o Maninho (PT), líder da bancada petista na Câmara. O valor do terreno para venda é de R$ 3,05 milhões, de acordo com cálculo feito pela Comissão de Avaliação de Imóveis de Diadema.
Sem utilidade - Na justificativa para venda da área localizada na Rua Coimbra, 812, que consta no projeto de lei, o prefeito de Diadema, José de Filippi Júnior (PT), explica que o "local não tem nenhuma utilidade pública, sendo que sua conservação é dispendiosa aos cofres públicos", referindo-se aos gastos com relação a sua estrutura e à intensa fiscalização para que a área não seja ocupada por terceiros.
Ainda de acordo com o chefe do Executivo, a área em questão foi desapropriada para uso do setor de Saúde Mental do município, o que não ocorreu até hoje. No ofício encaminhado à Casa, existe a informação de que o "Conselho Municipal de Saúde já se manifestou a favor da venda do terreno".
Maninho disse que terá entre amanhã e quarta-feira uma reunião com o secretário de Saúde, Osvaldo Misso, e os vereadores da bancada do PT. "O recurso da venda é pra quem, pra que e por quê", questionou o petista. Ele ainda disse: "Nós, vereadores, não estamos ainda convencidos da venda da área verde, a não ser que seja para construção de um equipamento popular."
A mesma opinião tem o oposicionista Lauro Michels (PSDB), que pediu pelo adiamento da votação do projeto por duas sessões. "Sou contra a venda e desconheço a finalidade. Diadema possui poucas áreas verdes para dar qualidade de vida à população", disse.
Detalhe: a justificativa do projeto do Executivo traz o pedido para venda em regime de "urgência especial".
Governo admite que local é de preservação
Apesar do interesse de venda do terreno por meio de licitação, a Prefeitura de Diadema reconhece que a área está classificada no Plano Diretor como de preservação ambiental 3 (AP-3). A taxa de ocupação não poderá ultrapassar a 30% do terreno, segundo a assessoria de imprensa da Prefeitura.
No entanto, questionada sobre o tipo de empreendimento para o local, a administração respondeu que pode "atender ao uso residencial, comercial ou industrial, desde que respeitadas as normas de preservação ambiental".
O vereador oposicionista
José Dourado (PSDB) prevê polêmica pela frente. "Essa área foi comprada para uso da Saúde Mental e até hoje não se investiu nada. Esperamos que o bom senso prevaleça por parte do governo e o pedido seja retirado da pauta", afirmou. O tucano disse ainda que o valor pedido para venda, inclusive, é "baixo", por conta da localização da área.
Alheios à venda ou qualquer outra manifestação política, Irani e Henrique Felisberto vivem há cerca de 12 anos ali, junto dos três filhos - dois deles praticamente nasceram no local.
Guarda civil patrimonial há 15 anos, Felisberto, 36 anos, tomava conta da área no passado. Hoje, mora em uma casa construída em parte do terreno e tem a função de caseiro. "Eu nem sabia que a Prefeitura quer vender aqui", disse Irani, 40 anos, com ar de preocupação. A Prefeitura informou que, em caso de venda, a situação da família "será analisada".

Peixes desaparecem da Billings

Flotação faz peixes desaparecerem da Billings
Adriana Ferraz
Do Diário do Grande ABC
O rendimento obtido com a pesca na Represa Billings caiu 80% na região do braço do Bororé, divisa da Capital com São Bernardo. Para os pescadores artesanais da área, o motivo tem nome: flotação. O sistema de tratamento usado no Rio Pinheiros para despejar ‘água limpa'' no manancial - após injeção de produtos químicos e oxigênio responsáveis por fazer a sujeira boiar - estaria espantando os peixes. A queda na atividade coincide com o início do bombeamento constante, em meados de abril.
A denúncia é justificada com as alterações observadas no ecossistema durante o período. Os pescadores contam (e mostram) que as redes voltam carregadas de uma espécie de lodo verde, incomum na região. "Já tem pouco peixe na água e o que tem foge porque consegue enxergar a rede. Estamos enfrentando uma situação muito complicada depois que esses testes começaram. Antes, conseguia pescar 80 quilos por dia, agora não passa de dez. Não dá para viver desse jeito", diz o presidente da Apar Billings (Associação dos Pescadores Artesanais da Represa Billings), Evaldo Bizarrias, 43 anos.
A surpresa maior é que a água está limpa, mesmo perto da margem. Os pescadores dizem que, em alguns pontos, a represa chega a ficar transparente. "Mas isso, por incrível que pareça, não está sendo bom. Parece que tudo está desequilibrado por aqui. Passo até 18 horas no barco tentando pescar, mas meu lucro não chega a 20% do que conseguia antes", conta Roberto Marcolino da Silva, 42.
Para piorar o quadro relatado, a comunidade do Bororé tem ainda de enfrentar uma proliferação de mosquitos. É possível notar o problema nas ruas e calçadas, repletas de insetos mortos. Os pescadores dizem que isso é a conseqüência da ausência do predador. Os peixes se alimentam das larvas desses insetos, se não há peixe, eles invadem as casas.
Até agora, porém, as denúncias não surtiram resultado. A associação, que reúne 147 pescadores, já encaminhou ofício aos órgãos ambientais da Capital e do Estado, mas até agora nenhuma equipe técnica foi destacada para estudar os impactos da flotação na área. "A gente vendia peixe até para a Ceasa (Central de Abastecimento) de São Paulo. Foi um tombo para todos nós. Alguém precisa estudar essa água", pede Bizarrias.
Pescadores fazem bico para sobreviver
Com o sumiço dos peixes na Represa Billings, os barcos ganharam nova função, pelo menos para o experiente João de Lima, 64 anos. Em busca do dinheiro perdido com a flotação, o pescador aposta no turismo. "Agora, levo os curiosos para verem as obras do Rodoanel. Tem uma ponte sendo construída aqui perto e um monte de gente pede para ver o trabalho aos finais de semana", diz.
Ainda desajeitado no posto de ‘guia'', Lima não sabe quanto cobrar. "Tenho que calcular a quantidade de gasolina que gasto. É o jeito que encontrei para sobreviver. Sou pescador há 18 anos e ainda me lembro da época em que os peixes pulavam na balsa. Era muita abundância, diferente de hoje", conta.
Quem ainda não desistiu de tirar o sustento da represa trabalha para agregar valor à quantidade pescada. É o caso do presidente da associação local. Evaldo Bizarrias não consegue mais vender o pescado puro. Precisa cortar, embalar e congelar. "Depois que saio da água, passo o dia todo fazendo esse trabalho e ainda assim não consigo tirar o rendimento que tinha antes. Eu me viro, mas tem gente que já procura emprego de servente de construção", afirma.
Algumas peixarias da Colônia Bororé também fecharam com a queda registrada na pesca. Mas apesar das dificuldades, a comunidade acredita que o desequilíbrio notado na região possa retroceder. A Apar Billings (Associação dos Pescadores Amadores da Represa Billings) defende a execução de um projeto de repovoamento do manancial, desde que trabalhado com ações de conscientização de ‘pescadores de varinha''.
"Eles não respeitam os peixes novos, que não podem ser tirados da água antes da hora para que, assim, consigam procriar. Para repovoar o reservatório, precisamos de pesquisa e organização. O equilíbrio tem de ser trabalhado de todos os lados", completa Bizarrias.
Responsabilidade - Especialistas em recursos hídricos são unânimes em afirmar que as denúncias dos pescadores devem, ao menos, ser apuradas. O coordenador do departamento da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), Ivanildo Hespanhol, acredita que os testes de flotação podem interferir no equilíbrio do meio ambiente local.
"Não sei se podemos fazer uma associação direta, mas a possibilidade deve ser levada em consideração. O processo de flotação utiliza produtos químicos muito fortes, como sulfato de cobre, que fica no lodo. Pode ser que essa matéria assimile muito oxigênio e aí o peixe vai embora", explica.
O professor do departamento de Química do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana) Geraldo Fontana diz que é preciso organizar um estudo de campo na área. "Os órgãos públicos devem tomar providências para saber se o problema é a flotação ou mesmo a quantidade exagerada de esgoto na água."
Governo do Estado não apresenta solução a pescadores
O governo do Estado não apresentou soluções para os problemas relatados pela associação de pescadores. A Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia) - responsável pela realização dos testes de flotação do Rio Pinheiros e do bombeamento para a Represa Billings - sequer respondeu aos questionamentos feitos pelo Diário. A empresa foi procurada durante três dias e nenhum técnico foi destacado para conceder entrevista.
A Secretaria de Estado do Meio Ambiente também não escalou equipe para visitar o local e fazer estudo detalhado da situação encontrada atualmente no braço do Bororé. A Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental), porém, afirmou que, até dezembro de 2007, os dados de qualidade avaliados não apresentavam alteração na água em função dos testes.
Em nota, a companhia afirmou que o processo tem tido sucesso em remover cargas orgânicas do rio, além de fósforo total, melhorando a turbidez e aumentando o oxigênio dissolvido no volume despejado na represa. As análises são válidas até janeiro deste ano. De lá pra cá, os resultados não foram revelados.