quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Poda da arborização urbana: um costume criminoso


Árvore mutilada pela Prefeitura de Santo André, não respeitando o ninho de Bem-te-vi
"As árvores são essenciais à vida do homem urbano. Isso porque: a) reduzem a poluição do ar provocada principalmente pela queima de combustíveis dos veículos automotores e indústrias; b) minimizam a poluição sonora; c) equilibram a temperatura da cidade; d) amenizam a força do vento; e) servem de habitat para insetos e pássaros que equilibram o ambiente e enfeitam nosso dia a dia; f) protegem o lençol freático; g) evitam o ressecamento do ar através da transpiração; h) fornecem sombra para os automóveis e pessoas; i) embelezam a paisagem.Sabe-se que a poluição atmosférica causada por veículos automotores e indústrias (liberando chumbo, dióxido de carbono, benzipireno e outros gases) é algo grave. Os veículos a motor são responsáveis pela produção de 80% do monóxido de carbono. É em decorrência dessa situação que se recomenda o máximo de cuidado para com a arborização urbana, lembrando-se que um hectare de árvore assimila cerca de cinco toneladas de carbono e libera de oito a dez toneladas de oxigênio por ano. Estudo mostra que apenas uma árvore transpira em média 400 litros de água por dia, produzindo o efeito equivalente a 5 condicionadores de ar. Logo, preservar as árvores do espaço urbano implica melhor qualidade de vida, sem dúvida.Todavia, principalmente no inverno, a maioria das cidades vira cenário de um nefasto costume. As árvores urbanas são criminosamente decepadas. Isso, à luz da legislação vigente, além de constituir infração e improbidade administrativa do administrador público que não fiscaliza, é crime com previsão expressa no artigo 49 da Lei Federal nº 9.605/98 (com pena de até um ano de prisão). Segundo a doutrina, a prática da poda foi trazida ao Brasil pelos imigrantes europeus, exclusivamente para árvores frutíferas (pereiras, macieiras, pessegueiros etc.). Com o passar do tempo, a poda começou a ser aplicada também em relação às demais espécies, embora seja consenso entre os técnicos que a poda de árvores não frutíferas é sempre prejudicial, pois representa agressão a um organismo vivo que possui estrutura e funções que restam seriamente danificadas em razão do corte.As árvores urbanas (não importando se nativas ou exóticas) jamais podem ser podadas, exceptuando-se raríssimas hipóteses legais, como árvores doentes ou que estejam causando perigo concreto à população. Entretanto, estamos diante da necessidade de mudança de costume, de cultura, o que provoca naturalmente muita controvérsia. Disse o cientista Michel Bachelet: “o comportamento dos homens é sobretudo feito de hábitos e sempre foi difícil modificar aquilo que acaba por ser confortável, mesmo que esse conforto crie por vezes erros funestos” (Ingerência Ecológica – Direito Ambiental em Questão, Instituto Piaget, Lisboa, 1995, p. 22).
É bom que se diga, ainda, que as árvores são essenciais tanto nas cidades grandes como nas pequenas.. Logo, se as árvores forem periodicamente podadas, mutiladas, é lógico que a população irá sofrer mais intensamente os efeitos desse tipo de poluição, experimentando sensível redução da qualidade de vida.Uma árvore que for reiteradamente podada tende a morrer e, sabidamente, não é comum as administrações públicas do interior procederem ao replantio de exemplares extintos (há quarteirões inteiros sem mais nenhuma árvore). E mesmo que houvesse a reposição imediata, convém lembrar que um exemplar recém plantado leva muitos anos para substituir plenamente uma árvore adulta no que se refere às funções antes apontadas. Nem é preciso dizer ainda que quase todas as arvorezinhas plantadas no espaço público das cidades são arrancadas ou quebradas por vândalos, sendo realmente raríssima a possibilidade de vicejamento. O único caminho racional, portanto, é a proteção da arborização existente, começando pela conscientização da população e aplicação da lei pelas autoridades (polícia, técnicos e promotores de justiça). Só isso fará com que se abandone definitivamente o costume criminoso da poda generalizada."
Por Nilton Kasctin dos Santos, Promotor de Justiça, Alexandre Figueiredo Barnewitz - Engenheiro Florestal e Analista Ambiental do Ibama e Mágida Cristiane de Almeida - Mestranda em Desenvolvimento pela Unijuí

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